Eu me sentia um animal em direção ao matadouro, sempre que ela me chamava. Não havia paz, nem liberdade, apenas sufoco e apreensão. No entanto eu ia, feito um bicho que não podia mudar seu destino. Era como se eu tivesse sido marcado a ferro e como se ela me dissesse: “quero ficar no teu corpo feito tatuagem, que é pra te dar coragem pra seguir viagem, quando a noite vem...” Mas seguir viagem me era fácil, difícil era chegar, mas eu chegava. E assim eu ia levando aquela escrava. Eu que pegava, esfregava, negava é verdade... Mas não lavava.
Ela, alucinada, me iluminava, dançando em meu corpo, feito bailarina, quando a noite vinha, ignorando meus músculos exaustos, repousava frouxa, murcha, farta, morta de cansaço. E não me largava, embora a despistasse, ficara marcada, posta em minha pele, de mim não desistia.
Eu não a esquecia, embora soubesse que não havia mais jeito; apesar de saber que não era bom ligar – e não fazia – mas ela ligava, escrevia, insistia. “Quero pesar feito cruz nas tuas costas, que te retalha em postas, mas no fundo gostas, quando a noite vem...” E lá seguia eu, meu ego enaltecido, meu corpo picado, riscados meus lombos, não querendo sangrar mais, nem de raiva, nem de dor, mas sangrava. Ela, uma boceta aberta em mim, querendo ser cicatriz, mas ria, corroia, vazava. Aberta a frio, a ferro e fogo, o nosso fogo, a carne viva.
Minha lembrança latejando seu gosto – meu gole – a flor aberta e delicada, que até hoje me arpeia, Sereia, Serpente, que até hoje mente, me rabisca o corpo, mas não sente.
(Baseado na canção “Tatuagem” de Chico Buarque e Ruy Guerra – Fernando Vieira, 16/12/08).
AAÊÊÊ!!!
ResponderExcluirChegou outro dia no mundo bloguiano e já tem quase o mesmo número de postagem do meu...haha
Tô curtindo os textos...tem sua cara, ácidos e, por certo, bens-humorados! Vou visitar sempre.
Fico lisonjeado por ter usado a numeração da minha página como inspiração para seu blog!
Abraço