quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

SOCORRO!



Socorro eu sinto demais!
A mínima fagulha, o insuportável.
Pra piorar, me deram um peito forte,
Que agüenta bem demais.

Socorro eu não consigo explodir!
Me acostumei a resistir a tudo,
A ranger os dentes, a calar meu grito
E a não molhar os olhos.

Socorro, ainda que não seja um berro,
Pois o desespero é real!
E meu silêncio apenas o jeito certo de ser.
É o meu jeito de balburdiar comigo mesmo.

Socorro porque não choro e, no meu caso,
Não chorar é chorar demais!
Há tempos que não venho chorando
E não chorar dói demais.

Socorro, alguém me ajude!
Ajude a esse homem solitário,
Que sabe muito bem qual caminho não vai seguir,
Mas não segue pelos caminhos que gostaria de ir.



(Fernando Vieira – Verão 2009).

segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

Explicações


É...Eu sei, alma, a culpa é minha.
A gente tenta se proteger
Mas, de repente, a força definha
E vai sentindo o desejo crescer

Também, o que você queria?
Aquela moça fez da nossa mente um prego!
Martelava, com sua beleza, todo santo dia!
Não havia como fazer-me de cego.

Além do mais, o que podíamos contra a sorte?
Parece já estar traçado o nosso destino:
Eu e minh’alma, vez por outra, sentindo o corte
Que sangra um amor sem eco, que todo dia refino.

Portanto, nem espere por milagres.
Não me venha com demências!
Pro que sentimos, não há exemplares.
Não conte com a Providência.

Lembremos, somente, daquele sorriso...
A luz que invade nossa treva;
Olhos molhados, cheios de brilho...
Saciam o meu ser, poeta que se preza.

(Escrito em 20/11/07 às 22:20 Para Emanuella)

terça-feira, 20 de janeiro de 2009

Humano sitiado.


Eu vejo a maldade nos olhos do menino
A inocência foi violentada
Até ela perdeu a pureza
Soltou suas mãos da esperança


Eu vejo o mal tomado por prazer
E a traição é tida por virtude
A vaidade engorda em nossos dias
Esfregando a escassez na cara das gentes


Um mendigo pede o pão e a criança lhe nega
Ele chora com os olhos e diz: Só um pão, só um pão...
O medo não abre os ouvidos, apenas os olhos tomados de terror,
Que por não verem mais o homem, permitem ao cérebro trabalhar:

Era só um pão, só um pão, só um pão...!

(Fernando Vieira).


segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

Eu, eu e eu, ou seja: nós!




Eu não tinha nenhuma noção de técnicas de representação. Apenas fazia aquilo que minha intuição mandava. Para mim era sempre eu mesmo e nunca um personagem. Um sujeito veio em minha direção, após aquela apresentação amadora e me disse o seguinte: “Parabéns! Você esteve ótimo. Vi em cena um personagem mesmo, não era você”.Aquilo me deixou desconcertado, confesso. Não esperava aquilo, pois, na verdade, o elogio deixou um segredo que eu guardava meio que “vulnerável”. Na verdade ele não estava vulnerável, mas, não sei porquê, senti isso. Afinal, eu guardava aquele segredo a sete chaves. Ninguém poderia descobrir que eu, simplesmente, fazia como se fosse eu mesmo. Com a pulga atrás da orelha resolvi assistir a uma gravação da peça apresentada e me ver. Resultado: levei um susto ao ver outra pessoa ali, em cena, e não mais eu!
A gente entra, então, para um curso profissionalizante de teatro achando que finalmente vai aprender a encenar de verdade. E acabamos desprezando aquilo que nos era inerente, inato. De alguma maneira caí no erro de achar que em cena eu deveria entrar em um outro ser, um outro eu para, dessa forma trazer a verdade e centelha de vida ao palco. Nada como alguns equívocos para entendermos nossos processos! Hoje tenho uma visão mais clara de como é esse caminho da verdade cênica. E acho que o trecho abaixo explica bem o que penso a respeito:
“(...) Sei que isto que estou descrevendo, pessoas divididas em si mesmas, caracteriza o que se chama de doença mental e que vem a ser o oposto absoluto de nossa visão de integração emocional. Toda a visão do Ocidente sobre saúde mental se volta precisamente à direção oposta: o desejável é a congruência entre a autoconsciência e o ser natural. Mas existem aqueles cuja sanidade flui da separação consciente destas duas coisas. Se é que existe um ser natural, um eu irredutível, é bem pequeno, acho, e pode até ser a raiz de toda a personificação – o ser natural talvez seja a própria habilidade, a capacidade inata de personificar. Estou falando sobre reconhecer-se que se é nitidamente ator, em vez de se engolir inteiro o disfarce de naturalidade e fingir que não se trata de uma representação e sim de você”.
“(...) Tudo que posso lhe dizer é que eu, de minha parte, não tenho um eu e que me sinto sem disposição nem capacidade de perpetrar, eu mesmo, a piada de um eu. Não resta dúvida, trata-se de uma piada sobre o meu eu. O que tenho, isso sim, é uma variedade de personificações que sei fazer, e não só de mim mesmo – uma trupe de artistas que possuo internalizada, uma companhia permanente a quem posso convocar quando é preciso um eu, um estoque em expansão de peças e papéis que formam meu repertório. Mas com certeza não tenho um eu independente de meus esforços impostores e artísticos de ter um. Nem iria querer um. Eu sou um teatro e nada mais que um teatro”. (Philip Roth – O avesso da vida – página 363 e 364).


A experiência em cena é que nos faz descobrir nossos rumos, pois se num determinado dia eu não tivesse entrado, esbaforido, sem tempo para me concentrar no meu personagem, jamais lembraria do que é entrar em cena de verdade, viver outra pessoa embora sendo eu mesmo. Aí, como diria Peter Brook, a gente sempre acaba dando uma volta enorme para retornar à primeira coisa que a gente pensou. Eu voltei para meus tempos de amador e descobri o talento inato e reprimido por meu excesso de teoria. Há uma frase que o professor Zé Aires me disse e que jamais esquecerei, a qual corrobora, exatamente, essa questão dos “eus” de Philip Roth: “O personagem está na cabeça de quem? Na sua ou na do público?” A resposta é o público, porque nós, atores, não teremos este poder de viver outra vida a não ser que façamos apenas uma coisa: Escolher com quais dos nossos eus vamos trabalhar. Sendo nós mesmos, sendo outra vida! Viva o teatro.

sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

Jabaquara


O caos
A tremedeira
A janela
O costume

O avião
O seu efeito
O telhado
O seu motor

O ônibus
O Cruzamento
Eu
Um Acidente

O motoqueiro
A Buzina
O meu sofá
Inesperado-corriqueiro

A minha vida
A minha casa
Eu na janela
Televisão.

(Fernando Vieira – 21 de outubro 2008).

segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

Complô


De novo o tempo
Foi como o vento
Passou por nós
Nem tomei tento

Fiz minhas cenas
A duras penas
Mas, com você,
Sequer resenhas

Tomei por pronto
O nosso encontro
Em vez de flor
Me deram tronco

Passou a vida
Por nossa lida
Por nossa cena
Não houve figa

Alguém parece
Que o mal nos tece
Por isso a Deus
Eu faço prece:

Que com carinhos
E muitos vinhos
Andemos juntos
Nossos caminhos


(14/12/07 23:44)